Hoje deu um aperto no coração, uma vontade incontrolada de sair na chuva, voltar a ser criança, fugir desse mundo insano. Onde amar, desejar o bem comum, ser solidário, está totalmente fora de moda aos olhos de muitas pessoas. Olho ao redor e fico perplexa, o que eu via apenas em ficção, é uma constante no mundo real. Pessoas criam personagens para suas vidas; elaboram contos-de-fadas, dramas, terror; criam cenários perfeitos, envolvem em seus roteiros as pessoas que as querem bem, sem avisá-las previamente que um dia o espetáculo terá um “gran finale”.
Leio por muitas vezes o que as pessoas entendem sobre o mundo real e o mundo virtual, e refletindo sobre o que pensam chego sempre a mesma conclusão, ambos são iguais, não pode haver distinção. Em ambos há apenas uma pessoa, com uma minúscula diferença, no mundo real somos a personagem que as pessoas vêem e convivem diariamente, fisicamente, com CPF e RG. Já no mundo virtual, somos um perfil com infinitas possibilidades de criação, porém permanecemos sendo a mesma pessoa, com os mesmos sentimentos, medos, receios, traumas, desejos.
Há os que se escondem de si mesmos, escondem suas fraquezas, os que desejam mudanças e não as enfrentam, os que querem apenas encontrar uma felicidade “cor de rosa” para uma vida nebulosa. E essa busca é uma constante para quem vive em um mundo onde sentimentos são como líquidos que escorrem por entre nossos dedos sem qualquer possibilidade de serem absorvidos por nosso coração.
Não acredito que esta perversidade seja da natureza humana, seja algo biológico, genético, hereditário, penso que é um conjunto de fatores que moldam o nosso pensar e o que temos como verdade para nossas vidas. Construídos pelo meio onde crescemos e apreendemos valores, conceitos e prioridades, construídos por instituições que nos revelam o que é certo e o que é errado e a quais verdades deveremos ter como reais.
Após esta “modelagem” que ocorre na infância e adolescência, de conceitos, preconceitos, de “verdades”, nos tornamos adultos quando acreditamos que somos responsáveis por nossas escolhas, e ignorando que já fomos modelados e diariamente somos manipulados, acreditamos que somos donos de nossas próprias vidas. Sem perceber, continuamos nos construindo a partir do que ouvimos, vemos, lemos, o que está ao nosso alcance, pois não há tempo para realmente aprofundarmos o conhecimento.
Passamos maior parte de nossos dias buscando a nossa sobrevivência e a dos nossos, tentando garantir moradia, água, luz, alimento, roupa, sapato, o básico para viver. E quando isto já nos é garantido pelo trabalho exercido, queremos mais e mais, a regra é consumir, consumir, consumir. Onde a prioridade deveria ser buscar “ser”, mas, como “ser” se o nosso tempo é destinado a “ter”? Então, conhecemos a palavrinha frustração, por vivermos em um ciclo vicioso, sem o tempo necessário para respondermos uma única pergunta: “Qual o meu papel no grande espetáculo da vida?”.
Penso que viver apenas uma personagem que nasce, cresce, torna-se adulto, envelhece e morre, sem sequer participar como personagem principal em apenas um capítulo, seja algo frustrante e decepcionante para qualquer pessoa que olhe sua história e veja que em nada contribuiu, ou nada fez para tornar este um mundo melhor para os que aqui vivem e que ainda chegarão. Olhar o passado, o presente e pensar que deixa apenas o cenário pronto para os próximos que vierem é o mesmo que organizar uma festa, preparar comidas e bebidas, decorar maravilhosamente e jamais dançar a primeira musica.
Eu quero um dia olhar pro passado, entender o meu presente e ter a certeza de que fui a mesma em qualquer momento, e o melhor, que escrevi a minha história, por minha vontade, dentro do que acreditei ser a minha verdade. Não a verdade absoluta, mas a que procurei construir a partir do que compreendo de certo e errado. E tenham a certeza, não sou e nunca serei perfeita, mas o mundo pelo qual luto e sonho é um mundo perfeito sem qualquer diferença para homens e mulheres, independente de suas escolhas. Não espero nada de ninguém, não crio falsas expectativas, respeito as diferenças e compreendo as limitações, por isso jamais me verão julgar qualquer pessoa por suas ações.
Se a regra geral para os autores do mundo de faz de conta inclui matar as personagens para que renasçam de suas próprias vidas, entendo que seus criadores tentarão mudar ao menos suas estratégias, pois poderá chegar o momento em que criador e criatura não mais conseguirão sobreviver em seus miseráveis papéis.
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